O coco verde é um fruto visto em abundância no litoral sergipano. Tanto que Sergipe se configura como um dos maiores produtores do país. O que muitos desconhecem é todo o potencial que pode ser aproveitado do produto, que inclui a água, rica em eletrólitos e nutrientes; a polpa, em fibras e gorduras saudáveis; e as folhas, que podem ser utilizadas na produção de artesanatos e, até mesmo, como material de cobertura de telhados. Além disso, a casca do coco pode ser utilizada como matéria-prima para a produção de fertilizantes, e assim contribuir para a redução do desperdício e promover práticas mais sustentáveis.
É pensando nisso que o Instituto Tecnológico e de Pesquisas do Estado de Sergipe (ITPS), autarquia do Governo de Sergipe vinculada à Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico e da Ciência e Tecnologia (Sedetec), vem desenvolvendo uma pesquisa inovadora para aproveitamento da casca do coco verde, com o intuito de valorizar os recursos naturais disponíveis e utilizá-los de forma sustentável.
Segundo dados fornecidos pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), no Brasil, em 2021, a produção de coco verde foi de 1.938.573 mil frutos. O resíduo equivale a 85% do peso total do produto. A geração é de 85.731 toneladas de resíduos (casca/ano). No mesmo período, Sergipe contabilizou 164.981 mil frutos, o que significa cerca de 10% da produção nacional. Com isso, Sergipe já acumulou 10% do resíduo do coco verde produzido no país.
Os estudos se concentram sobre a produção de fertilizantes à base de biocarvão (BCFs), advindo de resíduos de coco verde, sua influência no crescimento das culturas e na biodisponibilidade de macro e micronutrientes no solo.
A pesquisa teve início em junho de 2022, em parceria com a Universidade Federal de Sergipe (UFS) e conta com o fomento da Fundação de Apoio à Pesquisa e à Inovação Tecnológica do Estado de Sergipe (Fapitec/SE). Participam da iniciativa a coordenadora do Laboratório de Microbiologia do ITPS, Drª Rejane Batista (supervisora); a engenheira florestal e doutora em Ciência de Solo, Danielle Vieira Guimarães (coordenadora), além dos engenheiros agrônomos Anderson Góes Rocha e José Carlos de Jesus Santos.
Alternativas
O projeto surgiu a partir da problemática do coco relacionada ao resíduo e do contexto da agricultura sustentável, como também da conservação do meio ambiente. É o que revela a pesquisadora Danielle Guimarães.
“Como Sergipe é um grande produtor de coco verde, a gente juntou isso à problemática do resíduo, porque quando se retira a água de coco sobra um material que não é aproveitado: a casca. Esse resíduo muitas vezes polui rios e, até mesmo, praias. É um ambiente propício para parasitoses. Com isso, a pesquisa entra nesse contexto de que precisamos encontrar alternativas de reuso dessa casca. Além disso, o biocarvão produzido já é algo que vem sendo bastante avaliado para gestão de resíduo, para reaproveitamento de resíduos”, explicou.
Ela destaca ainda a importância do projeto do ponto de vista socioambiental e econômico, que pode contribuir para a redução do desperdício de resíduos e a diminuição da dependência de fertilizantes químicos, o que resulta em benefícios ambientais.
“A casca do coco verde demanda cerca de 12 anos para ser decomposta. Quando a gente retira do ambiente um resíduo e passa a agregar valor e desenvolver novos produtos que são úteis para o dia a dia da população, contribuímos para melhorar a renda de várias pessoas, além de estimular e incentivar as novas fábricas. Essa bagaço do coco ocupa muito espaço nos aterros sanitários e, durante a sua decomposição, solta um líquido com compostos que podem prejudicar o solo, se não for descartado em lugar apropriado”.
A pesquisa
Desta maneira, o principal ingrediente do fertilizante é o biocarvão, obtido por meio da pirólise – processo de queima sem a presença do oxigênio – da casca do coco verde, podendo ser utilizada no solo para favorecer a qualidade do meio ambiente e potencializar o crescimento de plantas.
Atualmente, a pesquisa se encontra na fase de caracterização do biocarvão, que consiste na aplicação em plantas para verificação da resposta do produto enriquecido e fortificado.
“A perspectiva de duração é até junho do próximo ano. Portanto, estamos na metade do projeto, cumprindo todo cronograma dentro do que foi estabelecido. Já realizamos toda a parte da caracterização, que é fundamental para a pesquisa. Agora, estamos na fase de validação, de observar esses dados e a resposta das plantas no cultivo e análise dos nutrientes”, revelou a coordenadora do projeto.
Benefícios
A pesquisa não apenas contribui para o desenvolvimento sustentável, mas também fortalece o setor agrícola de Sergipe, ao possibilitar a expansão da produção agrícola de forma mais eficiente e ecologicamente responsável.
Segundo Danielle Guimarães, os resultados parciais sinalizam que a alternativa apresenta respostas interessantes para a produção de milho, uma cultura de grande importância para o estado de Sergipe. “Atualmente, o teste está sendo realizado com a cultura do milho, já que existe uma importância muito grande para o estado. Mas a gente também pretende avaliar esse biocarvão em hortas. Estamos com o experimento instalado, aguardando a germinação de alface, por exemplo”, informou a coordenadora.
O estudo tenta levantar ainda as vantagens desse tipo de fertilizante na melhoria da estrutura do solo, no aumento da produtividade, melhor qualidade dos alimentos e redução de custos para os agricultores. “A ideia da gente é que seja uma tecnologia acessível ao pequeno produtor. O nosso forno é artesanal, feito de material também reciclável. Desta maneira, a gente tenta fazer de uma forma sustentável para que chegue de forma mais fácil ao produtor”, disse Danielle Guimarães.
ITPS
A pesquisadora Rejane Batista destacou ainda a importância do ITPS para a promoção da pesquisa, ciência e tecnologia no estado. A instituição, que celebra 100 anos de existência em 2023, é o terceiro instituto de ciência, tecnologia e inovação criado no Brasil, demonstrando o pioneirismo do povo sergipano.
“Além de contribuir lá na base, temos também a preocupação de contribuir com a indústria na questão da formulação, composição nutricional dos alimentos. A gente estimula a abertura de novas fábricas. O foco gira em torno da governança, do meio ambiente e do social. Porque o ITPS é um estepe para as empresas também de pequeno porte. Aqui desenvolvemos pesquisas aplicáveis de fato tentando sanar alguns problemas sociais, ambientais e governamentais. Hoje, a maioria das nossas pesquisas tem sido voltada para tecnologia sustentável, que é uma preocupação universal”, salientou Rejane Batista.
Ineditismo
A pesquisadora Danielle Guimarães destaca o pioneirismo da pesquisa que une a produção do biocarvão e a casa do coco verde. “Apesar de haver muitas pesquisas com a utilização da casca verde, um estudo como este, envolvendo esse fim, com essa metodologia específica, não existe. Ela traz um ineditismo dentro da proposta específica. Já existe bastante pesquisa com o biocarvão, com a casca do coco, mas os dois juntando ainda é algo recente”, disse.
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